CULTURAS

Artigo Técnico: Controle biológico na citricultura

O uso de defensivos biológicos na citricultura surge como alternativa, pois não geram resíduos em alimentos e não são tóxicos para saúde.

Atualmente, a pressão de pragas e doenças na citricultura é bastante significativa. Sabe-se que uso contínuo de inseticidas e fungicidas químicos do mesmo grupo químico, sem outras estratégias de controle, vem causando o surgimento de pragas ou patógenos resistentes no ambiente dificultando o controle. Alguns casos já constatados de resistência na citricultura são o psilídeo, o ácaro da leprose e a mancha marrom de alternaria.

Além disso, a lista de defensivos permitidos para uso na laranja indústria, utilizada no processamento de suco, está cada vez mais restrita para atender as exigências regulatórias dos clientes importadores como Estados Unidos, Europa e Japão, que exigem a produção de alimentos com o menor impacto ambiental possível.

Nesse contexto, o uso de defensivos biológicos na citricultura surge como alternativa dentro de um manejo integrado com outras estratégias de controle, pois não geram resíduos em alimentos e não são tóxicos para saúde humana. Além disso, não há risco de desenvolvimento de resistência de pragas e/ou patógenos, não há período de carência ou intervalo de segurança para colheita.

Nos citros, alguns exemplos de inseticidas/acaricidas biológicos ou micro-organismos que podem ser utilizados são:

  1. Bacillus thuringiensis
  2. Isaria (Cordyceps) fumosorosea
  3. Beauveria bassiana
  4. Metharizium anisoplieae

BACILLUS THURINGIENSIS (BT)

O Bacillus thuringiensis, tambem conhecido como BT, é um inseticida microbiológico composto por uma bactéria que atua através da ingestão. Por exemplo, nos citros, no momento em que a lagarta do bicho furão vai perfurar o fruto, ela ingere a casca com o inseticida microbiológico, o BT. Após a ingestão, as lagartas param de se alimentar em algumas horas, interrompendo o dano no fruto. O BT age por mais tempo quando misturado com óleo mineral ou vegetal.

Nos citros, o período ideal de aplicação é definido por meio do monitoramento com a armadilha Ferocitrus Furão.

ISARIA (CORDYCEPS) FUMOSOROSEA; BEAUVERIA BASSIANA; METHARIZIUM ANISOPLIEAE

Isaria (Cordyceps) fumosorosea; Beauveria bassiana e Metharizium anisoplieae são fungos entomopatogênicos, ou seja: são fungos capazes de causar doenças nas pragas, reduzindo a mobilidade, impedindo que se alimentem e causem danos as culturas e até levar à morte.

Quando esses fungos entomopatogênicos entram em contato com as pragas, os conídios ou esporos desses fungos germinam e penetram no tegumento/na casca do inseto; em seguida, iniciam a colonização do corpo do inseto ou ácaro internamente e começam a liberar toxinas, levando o inseto ou ácaro à morte.

O tempo até a morte varia conforme o micro-organismo, mas normalmente leva em torno de 3 a 4 dias após a infecção.


ISARIA (CORDYCEP)S FUMOSOROSEA

A Isaria (Cordyceps) fumosorosea é um inseticida e acaricida que pode ser usado para potencializar o controle do psilideo, além de ajudar também no controle do ácaro da leprose, da mosca negra e do pulgão preto (CONCESCHI,2017). No caso do psilídeo, pode controlar as fases de ninfas e adultos.


BEAUVERIA BASSIANA

A Beauveria bassiana também é um inseticida e acaricida microbiológico à base de um fungo entomopatogênico que age por contato. Nos citros, pode ser utilizada para potencializar o controle de ácaros e auxiliar no controle de ninfas do psilídeo (PADULLA, 2009; PINTO, et al. 2012).


METHARIZIUM ANISOPLIEAE

O Metharizium anisoplieae também é um fungo entomopatogênico que pode ser usado no controle de pragas nos citros. Há trabalhos na literatura comprovando a eficácia contra a cochonilha branca (Planococcus citri) (MASCARIN et al. 2011) e a broca da laranjeira (Cratosomus flavofasciatus) (GALLO et al., 2002). Há também trabalhos sendo conduzidos em campo para verificar a eficácia com outras cochonilhas como a escama farinha.


FUNGICIDAS BIOLÓGICOS DE PARTE AÉREA

Atualmente, as formulações bactericidas utilizadas para prevenir a propagação do cancro cítrico são à base de cobre que, quando em excesso, pode causar lesões em folhas, frutos e ramos, provocando sua queda. Por isso, a adoção de compostos de baixo impacto ambiental que possam prevenir as plantas de citros de serem infectadas pela bactéria do cancro é fundamental para um manejo mais sustentável.

Segundo o portal AGROFIT do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, há dois fungicidas biológicos registrados para controle do patógeno Xanthomonas citri subs. citri, bactéria responsável pelo cancro cítrico. Os dois defensivos biológicos registrados têm como ingrediente ativo a bactéria Bacillus subtillis.

Além da bactéria, esses fungicidas microbiológicos possuem em sua formulação lipopeptídeos e enzimas que atuam na defesa da planta por diversos mecanismos de ação. Os lipopeptídeos (surfactina, fengicina e iturina) atuam como indutores de resistência, ativando mecanismos de defesa da planta. Também possuem ação antifúngica e antibiótica e provocam a deformação da membrana celular dos patógenos. Agem também por competição contra o patógeno, competindo por espaço e nutrientes na superfície vegetal. No entanto, apesar de agirem no interior das células da planta, não possuem ação sistêmica e agem somente no local da aplicação, exigindo aplicações sequenciais à medida que a planta emite novas brotações.

Recomenda-se sempre aplicações preventivas, antes da infecção. Porém, em caso de condições climáticas favoráveis a doença, como temperatura e umidade elevadas, deve-se incluir o uso de cobre no manejo. Podemos concluir que o uso de fungicidas biológicos pode ser adotado no manejo integrado de cancro cítrico quando utilizados com critério, como em condições climáticas não tão favoráveis ao cancro e pomares com baixo ou sem histórico da doença.


TAMARIXIA RADIATA

Além dos micro-organismos há também macro-organismos parasitoides que podem ser utilizados na citricultura. A Tamarixia radiata é uma vespa parasitoide específica de ninfas do psilídeo, inseto vetor do Greening. Pode ser empregada no manejo externo, ou seja, em locais onde não é feito o controle químico do psilídeo, como pomares abandonados ou áreas urbanas e rurais com presença de plantas cítricas ou de murta, hospedeiras da bactéria do greening e do psilídeo. Segundo o Fundecitrus, a vespinha Tamarixia radiata deposita seus ovos no interior das ninfas do psilídeo, que serve de alimento para as larvas quando elas nascem. A Tamarixia radiata parasita apenas o psilídeo, portanto não causa nenhum desequilíbrio ambiental.

Fêmea de Tamarixia radiata ovipositando nas ninfas de psilídeo.


TRICHOGRAMMA

Outras vespinhas que podem ser empregadas no controle biológico dos citros são Trichogramma pretiosum e Trichogramma atopovirilia. Ambas são parasitoides de ovos de lepidópteros em geral como lagartas, incluindo as lagartas do bicho furão dos citros.A forma de aplicação pode ser feita com uso de drones liberando ovos de Trichogramma em cartelas, voando o mais próximo possível do ponteiro das árvores, seguindo as linhas de plantio. Segundo CANTORI et al 2023, os inseticidas abamectina, abamectina + Ciantraniliprole, Ciantraniliprole, e Sulfoxaflor são seletivos e não persistentes; portanto, podem ser utilizados em manejo integrado com Trichogramma atopovirilia. Para o Spinetoram, deve-se respeitar um intervalo mínimo de 21 dias após aplicação do inseticida químico para que não prejudique o Trichogramma.


CONCLUSÃO

É importante ressaltar que, para o sucesso do controle biológico, alguns cuidados precisam ser tomados. Por exemplo, verificar o local e a temperatura adequada de armazenamento; realizar aplicações preferencialmente no fim da tarde ou em dias nublados, com temperaturas mais amenas e umidade relativa do ar mais alta; consultar com o fornecedor as tabelas de compatibilidade de mistura no tanque (o que pode ou não ser misturado); e o pH final no tanque entre 5,0 e 7,0, ideal para a maior parte dos micro-organismos utilizados no controle biológico. Já no uso de macro-organismos parasitoides, recomenda-se atenção ao intervalo de aplicação entre o químico e à liberação dos agentes biológicos, caso seja manejo integrado.

REFERÊNCIAS

Avery, Pasco & Wekesa, Vitalis & Hunter, Wayne & Hall, David & McKenzie, Cindy & Osborne, Lance & Powell, Charles & Rogers, Michael. (2011). Effects of the fungus Isaria fumosorosea (Hypocreales: Cordycipitaceae) on reduced feeding and mortality of the Asian citrus psyllid, Diaphorina citri (Hemiptera: Psyllidae). Biocontrol Science and Technology. Biocontrol Science and Technology. 21. 1065-1078. 10.1080/09583157.2011.596927.

CANTORI, Lucas Vinicius et al. Is integrated management of Gymnandrosoma aurantianum possible with Trichogramma atopovirilia and novel products used in citrus orchards in Brazil?. Insects, v. 14, p. 1-12, 2023Tradução. Disponível em: https://doi.org/10.3390/insects14050419. Acesso em: 30 ago. 2023

CONCESCHI, Marcos Roberto. Parâmetros a serem considerados nas pulverizações do fungo Isaria fumosorosea para o manejo de Diaphorina citri. 2017. Tese (Doutorado em Entomologia) – Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, Universidade de São Paulo, Piracicaba, 2017. doi:10.11606/T.11.2017.tde-29082017-091810. Acesso em: 2023-08-25.

GALLO, D.; NAKANO, O.; SILVEIRA NETO, S.; CARVALHO, R. P. L.; BATISTA, G. C.; BERTI FILHO, E.; PARRA, J. R. P.; ZUCCHI, R. A.; ALVES, S. B.; VENDRAMIM, J. D.; MARCHINI, L. C.; LOPES, J. R. S.; OMOTO, C. Entomologia Agrícola. Piracicaba: Fealq, 2002. 920p.

Moura Mascarin, Gabriel & Pauli, Giuliano & Lopes, Rogerio. (2011). Susceptibility of the citrus mealybug, Planococcus citri, to Metarhizium anisopliae. Citrus Research and Technology. 32. 155-160. 10.5935/2236-3122.20110018.

PADULLA, L.F.L.; ALVES, S.B. Suscetibilidade de ninfas de Diaphorina citri a fungos entomopatogênicos. Arquivos do Instituto Biológico, v.76, p.297-302, 2009.

PINTO, A. P. F. et al. Patogenicidade de Beauveria bassiana ao psilídeo Diaphorina citri e compatibilidade do fungo com produtos fitossanitários. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v. 47, n. 12, p. 1673–1680, dez. 2012.

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