Com o surgimento e expansão do huanglongbing (HLB, ex-greening) novas estratégias de produção, assim como, novas técnicas de melhoramento genético estão sendo avaliadas para a citricultura e visam superar os desafios encontrados na produção de citros.
O Centro de Ciência para o Desenvolvimento (CCD-CROP-IAC), com sede no IAC em Campinas, tem como objetivo estratégico principal ampliar a base científica e tecnológica para solução de problemas bem definidos em três diferentes culturas do agronegócio brasileiro: citros, cana-de-açúcar e café.
A escolha da linha temática genômica e biotecnologia justifica-se pelo atual estado da arte que os programas de melhoramento, com forte inserção de biotecnologia, têm no IAC. Apoiado por projetos com agências de fomento e/ou parcerias com empresas, esses programas, além de significativa base genética, representada por seu germoplasma, acumularam bases de dados de genomas, transcriptomas, genótipos geneticamente transformados e conhecimento genético-molecular de processos de interação biótica e abiótica, bem como processos bioquímicos importantes na expressão de características fenotípicas e agronômicas.
Ao focalizar as três mais importantes cadeias do agronegócio paulista, o CCD-CROP-IAC alinha-se com a necessidade de buscar soluções que podem ter alto impacto no setor e no Estado. Juntas as três cadeias têm valores brutos de produção da ordem de 55 (citros), 97 (café) e 255 (cana) bilhões de reais, com o Estado de São Paulo representando 52, 12 e 48% da produção nacional, respectivamente. Em que pese a importância dessas cadeias de produção do agronegócio elas têm desafios científicos e tecnológicos que necessitam ser abordados.
Tais desafios limitam sua manutenção, reduzem competitividade, aumentam custos e impactam o meio ambiente com suas atuais soluções. Em cada uma das três culturas abordadas no CCD-CROP-IAC são focalizados problemas específicos com propostas de solução. Em citros, o foco é o Huanglongbing (HLB), considerada a mais devastadora doença de citros no mundo. A proposta focalizará três linhas de atuação, que já se encontram em andamento: avaliação de citros geneticamente modificados (GM) em ensaios de campo, edição gênica por CRISPR para reduzir a resposta de hipersensibilidade (HR) de plantas infectadas pela bactéria do HLB e genotipagem e uso de porta-enxertos tolerantes ao HLB e que induzem menor porte da variedade copa para um novo sistema de produção.
No presente artigo, vamos focar uso de porta-enxertos que já foram avaliados quanto à tolerância ao HLB e que induzem menor porte da variedade copa. Apesar da variação de resultados, alguns estudos nos EUA e Brasil indicaram diferenças na incidência e severidade de danos pelo HLB em função do porta-enxerto utilizado para várias copas, resultando em diferentes níveis de tolerância de campo. A estratégia aqui no CCD-CROP-IAC, é estudar citrandarins (híbridos de microtangerinas x Poncirus trifoliata) que têm se mostrado mais tolerantes ao HLB, que induzem menor porte às variedades copa e que sejam mais tolerantes à seca visando ao estabelecimento de um novo sistema de produção que permita redução do espaçamento entre as plantas para melhor aproveitamento da área do pomar, possibilitando aumento notável da produtividade, sem prejuízos à qualidade dos frutos.
De acordo com o com o inventário do Fundecitrus Nos plantios mais recentes, a densidade de plantas por hectare é maior do que nos talhões mais antigos, implementados há cerca de duas ou mais décadas, mas de 2018 em diante, começou a diminuir. A dificuldade de manejo em pomares de altíssima densidade evidenciou que a relação de plantas por hectare tinha chegado ao extremo e precisava ser reajustada. Os pomares implementados em 2021, por exemplo, têm, em média, 581 árvores por hectare, cerca de 10% de plantas a menos do que os formados em 2017. Isso evidencia a necessidade de utilizar porta-enxertos ananicantes como um fator inerente ao aumento da densidade de plantas. Contudo, é necessário um planejamento adequado que considere aspectos como combinações de copas e porta-enxertos, uso de irrigação quando necessário e um nível técnico alto no sistema de produção. Neste contexto, o porta-enxerto trifoliata Flying Dragon e os citrandarins, por exemplo, estão sendo usados em plantios de alta densidade.
Assim, o plantio adensado permite aumentar a produtividade de frutos por área nos primeiros anos de produção e reduzir o período de retorno financeiro, apesar do maior custo de implantação dos pomares. Além disso, o plantio em alta densidade reduz as perdas por doenças como Huanglongbing (HLB) pela compensação das plantas erradicadas. No entanto, esta tecnologia requer controle efetivo do crescimento da copa das plantas. No Brasil, pomares cítricos adensados têm densidades entre 600 e 1250 plantas ha-1, com distâncias de 4 a 6 m entre linhas e 2 a 3 m entre plantas. Já, pomares ultradensados são aqueles onde as densidades de plantio variam de 1.500 a 2.000 plantas ha-1 (Gonzatto et al., 2022).
Em experimentos realizados pelo Centro de Citricultura em conjunto com empresas parceiras, os resultados se mostram promissores. Como um exemplo, um experimento com laranja Pera como variedade copa sobre diversos citrandarins foi estabelecido na Região Norte/SP. Porta-enxertos foram avaliados visando não só à produtividade e ao desenvolvimento das plantas, como também, selecionar combinações copa/porta enxerto que favoreceram melhores características físico-químicas dos frutos e maior tempo de prateleira da fruta. Estes estão instalados desde 2013 e estão em seu quinto ano de avaliação. Vinte porta-enxertos, sendo 18 citrandarins: os citrandarins provenientes do cruzamento entre Citrus sunki x Poncirus trifoliata cv. Rubidoux (18, 26, 47, 68, 70, 73, 110, 124, 128, 137, 139, 148, 150, 151, 152, 248, IAC 3299 Muriti) e Sunki x Benecke (IAC 1697), proveniente do cruzamento entre tangerina Sunki x Poncirus trifoliata cv. Benecke. Os citrumelos W2 e o Swingle [Citrus paradisi Macfad. x Poncirus trifoliata (L.) Raf.] foram avaliados como variedades padrão.
Os resultados demonstram diferenças de crescimento entre os porta-enxertos, o que é refletido na produção de frutos nas três safras avaliadas (Figura 1). Contudo, como destaque geral, o citrandarin IAC 3299 Muriti, porta-enxerto semi-ananicante, obtido no programa de melhoramento de citros do Centro de Citricultura do Instituto Agronômico – IAC, continua demonstrando bons valores em crescimento, com um porte desejado para a citricultura atual, alta tolerância a seca, pelo seu maior potencial hídrico (Figura 2) e bons índices de produção (Figura 1), de eficiência produtiva (Figura 3) Dentre os demais materiais, também se destacam o 18, 47, 70, 73, 124, 128 e 139, que podem vir a se tornarem novas opções. Vale ressaltar que dentre esses, apenas o 47 demonstra maior potencial hídrico foliar, o que indica que este híbrido possui alguma característica que o confere menor potencial hídrico. Porém, novas avaliações devem ser realizadas para essa inferência.
A importância de tais resutados são corroborados pela demanda de materiais mais resistentes à seca, visto a recente quebra de safra em 21/22, de aproximadamente 31,2 milhões de caixas – mesmo sendo um ano de bianualidade positiva para os citro. Neste ano foi estimado que 65% das áreas eram em sistema de sequeiro, e que houve secas severas em praticamente todas as regiões do cinturão citrícola (Inventário Fundecitrus, 2022). Assim, cabe o questionamento, mesmo que provocativo: e se nosso parque citrícola fosse composto de materiais mais tolerantes à seca? Partindo deste pressuposto, com materiais que neste ano demonstraram aproximadamente 30% a mais de produção (Figura 3), essa conta poderia ser revertida e ainda ter alcançado 41 milhões de caixas de ganho, o que representaria em torno de US$ 200 milhões de ganho para o setor. E conforme já mencionado ao longo deste, com o atual cenário da citricultura, onde é desejado o menor porte da planta aliada a boa produção, novas análises de produção ajustada demonstram que ainda há potencial para esses novos materiais sejam adequados a diferentes espaçamentos, e consequentemente, a novas densidades de plantio (Figura 4). Estimativas com médias de três safras demonstram que materiais como 128, 139 e o IAC 3299 Muriti têm potencial para alcançar valores acima de 2000 caixas/ha, Assim, mostra-se indispensável o investimento em novos experimentos com porta-enxertos tão promissores, que podem contribuir para uma citricultura (ainda) mais produtiva.
Referências Inventário de árvores do cinturão citrícola de São Paulo e Triângulo/Sudoeste Mineiro: retrato dos pomares em março de 2022 / Fundo de Defesa da Citricultura… [et al.]. – Araraquara,SP : Fundecitrus, 2022. 116 p.
Gonzatto, MP; Griebeler, SR; Schwarz, SF. Dwarfing Rootstocks for High-Density Citrus Orchards DOI: http://dx.doi.org/10.5772/intechopen.102851, 2022
Dr. Rodrigo Martinelli
Pós-doc Centro de Citricultura Sylvio Moreira/Instituto Agronômico
Dra. Mariangela Cristofani-Yaly
Pesquisadora Científica Centro de Citricultura Sylvio Moreira/Instituto Agronômico