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Tendências no Agro: Os impactos da produção brasileira no mundo

A combinação de terra abundante, com solo fértil e investimentos em tecnologia, vem posicionando o agronegócio brasileiro como uma potência cada vez mais forte, que traz impactos na economia mundial. Essa é a análise de Alexandre Mendonça de Barros, um dos consultores de mercado do agronegócio mais respeitados do Brasil. Engenheiro Agrônomo pela ESALQ/USP e Doutor em Economia Aplicada, Mendonça de Barros tem participação ativa nos conselhos de importantes empresas do setor.

Acredito que vamos viver a era da biologia e o Brasil está muito bem-posicionado, pois temos terra, chuva, sol e pessoas qualificadas em todas as áreas de atuação” 

Nesta entrevista para a Revista Coopercitrus, ele compartilha insights valiosos sobre os principais movimentos necessários para manter o Brasil como uma potência agrícola internacional, enquanto explora os desafios logísticos, a influência das cooperativas no apoio aos produtores rurais e as oportunidades emergentes da produção sustentável. 

Coopercitrus – Quais são os movimentos que você considera essenciais para o Brasil manter sua posição de liderança no mercado agropecuário nos próximos anos?

Alexandre Mendonça de Barros – O Brasil tem presença cada vez mais forte em alguns mercados, com destaque absoluto para a soja e para a carne bovina no mercado internacional. Então, em essência, o que acontece com o Brasil pode afetar o mercado internacionalmente. Normalmente exaltamos isso e com razão; é para termos orgulho, mas o mais importante é saber qual a consequência de ser grande — e nós, enquanto produtores, temos que ter essa consciência.

Neste ano, colhemos a maior safra de soja, com 160 milhões de toneladas, mas também é a safra menos vendida antecipadamente dos últimos anos. Qual a implicação prática disso? Na hora que entra uma safra deste tamanho, olhando para a minha produção que é pequena perto do todo, posso ter tomado uma excelente decisão, a princípio, de não ter vendido. Mas na hora que todos forem vender, já que ninguém vendeu, o mercado desaba. E foi o que aconteceu.

É sempre bom ter como exemplo: se todos andarem na mesma direção, provavelmente vai acontecer uma coisa pior. Dado o nosso tamanho, nós afetamos inclusive o mercado internacional. Vemos os preços da soja caírem muito. Se compararmos o preço de Chicago com o do porto de Santos, nós passamos a receber muito mais do que deveríamos, porque não havia onde armazenar a produção e tínhamos que exportar muito rápido.

A mesma coisa nos insumos: todos postergaram a compra e, agora, tem uma certa corrida aos insumos; os preços começaram a subir. O alerta é que o produtor, quando for estudar sobre a comercialização, precisa analisar sua própria decisão e, principalmente, o que está acontecendo no mercado. Se todos tiverem vendido pouco, o risco é muito maior.

Coopercitrus – O que os produtores podem esperar em termos custos de produção para a próxima safra?

Alexandre Mendonça de Barros – Não vejo no mercado internacional uma tendência muito forte de alta no preço dos insumos. Acredito que todos os problemas que a guerra entre a Ucrânia e a Rússia causaram no ano passado foram atenuados. Afinal de contas, as exportações de fertilizantes da Rússia conseguiram encontrar o mercado internacional.

Os russos são muito importantes para o mercado de fertilizantes, principalmente o potássio, mas também os nitrogenados e os fosfatados. Este ano o mercado já encontrou as maneiras de escoar a produção russa. Não esperaria grandes altas. Mas o que está latente é o fato de o mercado de insumos estar tão atrasado na compra que podemos ficar sem a entrega. Este ano estou ficando um pouco mais preocupado com esse comportamento.

Coopercitrus – Qual é o seu conselho para os produtores se prepararem pensando em questões de logística?

Alexandre Mendonça de Barros – O risco do gargalo logístico para este ano é real. Houve um atraso grande na compra e os importadores de fertilizantes não estavam vendendo. Os preços estavam caindo e as importações perderam a aceleração justamente por não estarem vendendo. Agora veio uma demanda muito alta e o Brasil é um país muito grande com uma logística a ser feita.

Os produtores estão deixando para comprar na prévia do plantio e acredito que esse mesmo problema deve acontecer na segunda safra. Mas, por outro lado, sinceramente não vejo outro viés de alta dos insumos ainda. É preciso fazer um planejamento e não deixar para a última hora, porque eventualmente teremos um problema.

Coopercitrus – Qual a sua opinião sobre o papel das cooperativas em apoiar os produtores rurais brasileiros, tanto em termos de negociação coletiva como de acesso a recursos e informações?

Alexandre Mendonça de Barros – Sem as cooperativas o sistema não seria tão eficiente como é, principalmente para quem é pequeno e médio produtor. As escalas do Brasil cresceram muito e o produtor, podendo comprar e vender coletivamente; isso ajuda muito com as negociações de margens, etc. Para quem tem escala menor, a cooperativa tem um papel muito importante também na disseminação de conhecimento, seja técnico, agronômico, econômico, para melhorar a gestão e a sucessão. São muitos assuntos onde podemos ver avanços com as cooperativas.

Hoje, seria impensável nas regiões do sudeste e sul do Brasil e, agora, cada vez mais na região do cerrado, não haver esse trabalho incrível das cooperativas. É uma vantagem o Brasil ter boas cooperativas. Vimos uma profissionalização do setor e isso era um problema. Os bancos e o mercado financeiro olhavam para as cooperativas no passado com desconfiança, pois elas não pareciam ser bem geridas em alguns casos. Não era regra, mas isso acontecia e gerava desconfiança no sistema. E esse é outro aspecto positivo: as cooperativas começaram a focar em gestão de primeira linha.

Então é uma combinação perfeita: são excelentes organizações, com excelentes profissionais e, ao mesmo tempo, dão garantia de boas margens, ajudando na comercialização, na proteção de preços e no conhecimento. Realmente é um sistema vencedor. Não vejo como o pequeno e médio produtor conseguiriam operar num mercado cada vez mais dinâmico e complexo sem o apoio das cooperativas.

Coopercitrus – Como as boas práticas e produção sustentável estão influenciando o mercado agrícola brasileiro? Quais oportunidades podem surgir a partir da produção sustentável na remuneração do produtor?

Alexandre Mendonça de Barros – O produtor brasileiro é muito cético com a questão da remuneração. No geral, ele associa as melhores práticas sustentáveis com custos – e de fato é assim, pois o custo aumenta. Mas ele ainda não consegue enxergar, por suas experiências anteriores, os benefícios disso. O tema do aquecimento global virou assunto do mundo inteiro e as pessoas estão percebendo e correlacionando as coisas do seu dia a dia com o aquecimento global.

A temperatura está muito alta e têm acontecido catástrofes com mais frequência, com chuvas muito fortes e incêndios no Havaí, Canadá, mudanças em lugares com clima temperado onde normalmente é muito frio. A mensagem é que esse assunto veio para ficar e será convertido em valor. Pode demorar um pouco, mas lentamente temos que nos posicionar e estar preparados para receber esses ganhos de melhoria do ciclo de carbono. Nós temos um longo passo, porque o sistema brasileiro é tropical, é a única grande cultura tropical do mundo.

As métricas de ciclo de carbono não são as mesmas daqueles coeficientes que acontecem na condição de temperatura temperada. Dado isso, precisamos ter parâmetros reconhecidos por revistas científicas nacionais e internacionais e debater nos fóruns internacionais que vão fixar os parâmetros de mensuração de carbono. Uma vez tendo isso auditado e com laudo, vamos começar a ver valor e o mercado de fato vai precificar e pagar por isso. Acredito que esse seja o caminho.

Coopercitrus – Existem algumas linhas de financiamento para o mercado de carbono. Esse é um dos caminhos?

Alexandre Mendonça de Barros – Esse é um caminho já concreto com linhas de crédito com juros mais baixos. É algo claro e monetizado. Mas temos o caso dos CBios (créditos de descarbonização) que funcionam muito bem na cadeia sucroalcooleira e que já estão precificados em bolsa, com remuneração adicional. Podem dizer que o carbono brasileiro transacionado é muito mais barato do que o que está lá fora. Isso acontece porque o mercado ainda não deu credibilidade ao sistema brasileiro, mas vamos chegar lá. Já está funcionando e está entrando dinheiro no bolso das usinas que produzem álcool.

É um passo para estar conectado ao comércio mundial de carbono; não estamos tão longe assim. Também já tem algo concreto, como no caso de financiamentos com juros mais baixos que funcionam como estímulo para a adoção da prática. Vai chegar o dia em que teremos um preço transacionado e vamos lançar um título auditado, mostrando que se está comprando carbono. Acredito que vamos viver a era da biologia, pois é a única maneira de resolver os problemas de aquecimento que estamos enfrentando.

A biologia será usada para atenuar o problema de aquecimento global e o Brasil está muito bem-posicionado, pois temos terra, chuva, sol e pessoas qualificadas em todas as áreas de atuação. Não consigo ver outro país com essa vantagem competitiva. Só que isso demora um pouco; temos que ser inteligentes e criar uma instituição brasileira, uma métrica e um posicionamento brasileiro, para fazer funcionar o mercado.

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