Prof. Dr. Marcos Fava Neves
Vinícius Cambaúva
Beatriz Papa Casagrande
A indústria da carne tem importância significativa para o movimento da economia brasileira. Só para se ter uma ideia, os embarques de carne bovina ocupam a quinta posição no ranking dos principais produtos exportados pelo Brasil, representando 3,7% do total negociado pelo país, segundo o Ministério da Agricultura. Apesar do bom desempenho, o ano de 2022 foi bastante atípico para as cadeias da pecuária, devido a inúmeros desafios enfrentados em diversos setores da sociedade. Dessa forma, tal conjuntura acabou sendo refletida no comportamento da oferta, demanda e, consequentemente, preços das proteínas animais.
O desempenho da exportação das três principais cadeias da pecuária brasileira – bovina, suína e aves – foi bastante animador. Segundo dados do Ministério da Economia, os embarques acumulados de janeiro a outubro geraram receitas de US$ 19,75 bilhões, valor 33,4% maior no comparativo com o mesmo período de 2021. Já os volumes totais cresceram menos, 8,5%, fechando em 6,26 milhões de t. Só a carne bovina exportou 1,7 milhão de t neste ano até outubro, 25% a mais que o ano anterior. Já os preços médios da t embarcada foram 18,2% superiores, ficando próximos dos US$ 6 mil/t. Nesse mesmo período, a proteína bovina teve receita de US$ 10,3 bilhões, 47,7% a mais em relação a 2021.
Olhando para os valores da carne suína, os embarques foram de 837 mil t, representando queda de 3,3% no comparativo com o mesmo período do ano anterior e que reflete a baixa na demanda da China, em vista da recuperação dos planteis de suínos pós crise da Peste Suína Africana (PSA). Os preços médios ficaram em US$ 2.340/t, sendo 5,5% abaixo do registrado no ano anterior. Já as receitas atingiram US$ 1,9 bilhão, 8,6% menor do que em 2021. Já na carne de frango, foram exportadas 3,7 milhões de t, 4,7% superior ao ano passado. Os preços médios ficaram em US$ 2.040/t, com 24,1% de valorização e gerando receitas de US$ 7,5 bilhões.
No Brasil, o consumo interno de carne bovina em 2022 chegou ao menor nível em 26 anos, segundo dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), com disponibilidade per capita calculada em 25,6 kg/habitante/ano. Em comparação ao início da série histórica em 1996, o valor deste ano é 33,8% menor. Com a maior oferta da proteína ao mercado internacional, os preços médios ao consumidor brasileiro se elevaram (além dos impactos de outros fatores como a inflação), o que motivou a busca por fontes alternativas.
Contudo, para 2023, o Rabobank projeta que o brasileiro irá consumir mais carne bovina, um avanço de 1,5%. Aliado a recuperação econômica e maior poder de compra do consumidor, esse cenário será um reflexo da safra recorde de grãos que está por vir e da inversão do ciclo pecuário com maior oferta de machos para abate, o que acaba pressionando os preços para baixo, favorecendo assim o consumo no mercado interno.
Permanecendo nas posições de liderança global em exportação das carnes bovina e de frango – e em quarto lugar da carne suína – em 2023, o Brasil deve aumentar as vendas externas das três cadeias. O Departamento de Agricultura dos EUA (USDA) estima um aumento de 4% na exportação de carne de frango (4,8 milhões de t), cerca de 3% na de carne suína (1,3 milhão de t) e de 1% na carne bovina (2,9 milhões de t).
Para as aves, isso deve ocorrer por conta da vantagem competitiva que o Brasil possui em conjunto com inúmeros desafios produtivos que os principais concorrentes do nosso país enfrentam. Aqui podemos mencionar os surtos de Influenza Aviária na Europa e na América do Norte, o aumento dos custos de energia na União Europeia e os efeitos da guerra, com quebra da produção ucraniana e redução dos excedentes exportáveis entre os europeus. Esse contexto desenha uma demanda global firme para a carne de frango no Brasil, alinhada também com a inflação, o que leva os consumidores em busca de produtos acessíveis.
Acerca dos suínos, o USDA projeta que o mercado brasileiro vai representar aproximadamente 10% do total exportado no mundo. O crescimento projetado está ligado a embarques para a América do Sul e Sudeste Asiático, inclusive as Filipinas, que passam por restrição produtiva devido a Peste Suína Africana (PSA). A China continuará sendo o principal destino do produto brasileiro, mas suas importações totais devem diminuir devido ao aumento da oferta interna graças a recuperação dos planteis de suínos, já citado por nós.
Em relação a carne bovina, a expectativa do USDA é que o produto brasileiro responda por cerca de 25% das exportações mundiais. Da mesma forma, espera-se que a China continue sendo a principal compradora, apesar da queda nas negociações em função do aumento da oferta doméstica no país asiático. Contudo, Argentina e Uruguai, principais concorrentes do Brasil no mercado chinês, terão oferta mais restrita de gado. O mesmo acontece com a Índia, configurando um cenário favorável aos embarques brasileiros também para o Oriente Médio e Sudeste Asiático. Ao todo, as exportações globais em 2023 vão chegar próximo dos 37 milhões de t e estima-se que o Brasil seja responsável em torno de 25% desse total.
Não só a população mundial vem crescendo de forma expressiva, como também a demanda por proteína animal. Essa junção de fatores proporciona um cenário bastante favorável ao Brasil, que por meio de uma produção cada vez mais intensiva e tecnológica é capaz de entregar ao mundo alimentos nutritivos, seguros e sustentáveis. Seguimos desempenhando essa importante missão!
Marcos Fava Neves é Professor Titular (em tempo parcial) das Faculdades de Administração da USP em Ribeirão Preto e da EAESP/FGV em São Paulo, especialista em planejamento estratégico do agronegócio. Vinícius Cambaúva é associado na Markestrat Group, formado em Engenharia Agronômica pela FCAV/UNESP e mestrando na FEA-RP/USP. Beatriz Papa Casagrande é aluna de mestrado na FEA-RP/USP com formação em Engenharia Agronômica pela ESALQ/USP.