Prof. Dr. Marcos Fava Neves
Vinícius Cambaúva
Beatriz Papa Casagrande
A safra 2022/23 de grãos no Brasil está sendo, em geral, marcada por boas produtividades. A estimativa de produção projetada pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) indica quase 314 milhões de toneladas, o que configura um volume 15,2% superior ao da temporada anterior. São incríveis 41,4 milhões de toneladas a mais de uma safra a outra, mais um recorde para a nossa conta. Além disso, a produtividade média das lavouras também caminha para ser a mais alta já registrada com 4,048 toneladas por hectare.
A alta na oferta também trouxe desafios relacionados a armazenagem, o que, entre outros fatores, impactou diretamente os preços de grãos. A Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq) projeta que o déficit de armazenagem no Brasil este ano pode alcançar 118,5 milhões de toneladas, sendo 41,2% maior que o registrado na safra passada.
Para a próxima safra, 2023/24, o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) divulgou o primeiro acompanhamento em maio. O órgão projeta uma produção global de milho em 1,219 bilhão de toneladas, aumento de 6,0% em relação ao ciclo passado. São 69,4 milhões de toneladas a mais principalmente devido a importantes países produtores, como os Estados Unidos e Argentina, recuperarem seu potencial de oferta após sofrerem impactos climáticos. Como resultado da maior oferta de milho em 2023/24, os estoques finais devem ficar em 312,9 milhões de toneladas, alta de 5,2% no comparativo com o ciclo anterior.
Enquanto isso, o Brasil deve praticamente manter o volume em 129,0 milhões de toneladas, contudo, dependendo do clima e recuperação dos preços, enxergamos uma chance, inclusive, de superarmos esses números. Diante desse cenário, nosso país deve exportar 56,0 milhões de t neste próximo ciclo, passando de vez os Estados Unidos, que irão embarcar 54,0 milhões de toneladas. Ou seja, estamos diante de uma mudança estrutural e não mais conjuntural, como observado em 22/23.
Olhando para a situação da soja, os números surpreendem. O USDA projetou a oferta global em 410,6 milhões de toneladas, crescimento de 10,9% no comparativo com 2022/23 ou 40,2 milhões de toneladas a mais. Só no Brasil, a oferta deve aumentar de 155,0 para 163,0 milhões de toneladas, uma alta de 5,2%. Com esse resultado, responderemos por 40% da produção global da leguminosa.
Por conta do volume expressivo, os estoques globais da oleaginosa podem ficar em seu maior patamar histórico, atingindo 122,5 milhões de toneladas no final da temporada 2023/24. Esse valor é 21,2% acima da safra anterior ou 21,5 milhões de toneladas a mais. Precisamos acompanhar esses números de perto, o comportamento dos preços da oleaginosa dependem desse cenário.
No algodão, o USDA indica que a produção deve ser menor em 2023/24, em 0,5%, estimada em 25,2 milhões de toneladas. O principal impacto deve ser registrado na China, cuja oferta será de 5,98 milhões de toneladas (- 10,5%). O Brasil deve produzir 2,89 milhões de toneladas (+ 1,9%). Já o consumo global deve crescer 6,0% neste novo ciclo, totalizando 25,3 milhões de toneladas. Por fim, do lado das exportações, os Estados Unidos devem seguir na ponta com 2,93 milhões de toneladas embarcadas da pluma (+7,1%), mas veem o Brasil se aproximar com 1,89 milhão de toneladas (+ 26,0%) e já responder por 20,0% do comércio mundial. Analisando os impactos desses números no mercado de grãos, é difícil imaginar que teremos uma tendência de alta nos preços, ao menos por enquanto. O principal fator para ficar de olho é a safra nos Estados Unidos e, por lá, o ritmo de plantio segue acelerado e o desenvolvimento das lavouras está bastante positivo.
Apesar do cenário “baixista”, é importante lembrar que muita água ainda vai passar por de baixo dessa ponte. É preciso seguir acompanhando: os desdobramentos da guerra entre Rússia e Ucrânia; o comportamento da economia global; o clima no Brasil; as definições relativas ao Plano Safra 2023/24; o ambiente político nacional e internacional; entre outros.
Mesmo em meio a tantos desafios naturalmente impostos à agricultura e ao período dos “3V’s – variáveis variando violentamente” que estamos passando, os produtores rurais seguem se superando no campo. Deixamos nossos votos para que, apesar dos desafios, essa próxima safra seja tão vitoriosa quanto a anterior.
Marcos Fava Neves é Professor Titular (em tempo parcial) das Faculdades de Administração da USP em Ribeirão Preto e da EAESP/FGV em São Paulo, especialista em planejamento estratégico do agronegócio.
Vinícius Cambaúva é associado na Markestrat Group, formado em Engenharia Agronômica pela FCAV/UNESP e mestrando na FEA-RP/USP. Especialista em comunicação estratégica no agronegócio.Beatriz Papa Casagrande é consultora na Markestrat Group e aluna de mestrado na FEA-RP/USP com formação em Engenharia Agronômica pela ESALQ/USP.